por
Consuelo Pondé de Sena
Publicada em 13/01/2015 23:50:00
Ao aceitar como verdadeiro o conceito firmado por Antônio Soares Amora, somente com o Romantismo é que ocorre o início da nossa autonomia literária. Com efeito, essa afirmativa nos conduz a ideia de que, durante os séculos XVI, XVII e XVIII, luso-brasileira teria sido a nossa literatura. Esse conceito, contudo, é contestado por muitos autores que recuam essa posição com a produção dos poetas da “Inconfidência” que revelavam inquietações relacionadas com a realidade histórica brasileira e eram dotadas de espírito antilusitano. Advogou essa posição Joaquim Norberto de Sousa e Silva, simpático ao denominado “grupo mineiro”, defensor de uma posição nacionalista desses literatos.
Outros tantos autores enxergam uma unidade evolutiva da nossa cultura literária, entendendo que uma mesma base geográfica, étnica e linguística, definia a cultura dos séculos XIX e XX, o que convertia esses tempos à cultura das centúrias anteriores. Todavia, prevalece o juízo de que a primeira fase, compreendendo os três primeiros séculos, estava imerso na cultura clássica do mundo português, sendo, portanto, um quadro da literatura luso-brasileira, enquanto o segundo instante, que já abrange cento e cinquenta anos da história nacional, configura o painel da literatura brasileira.
Dessa forma, o conceituado intelectual português, o já citado Soares Amora, que tive o privilégio de escutar aqui na Bahia, entende que a literatura luso-brasileira teve vigência dos meados do século XVI (1549 em diante) e se prolonga até o começo do século XIX (1808), desde quando o Brasil esteve, inapelavelmente, subordinada à política imperial portuguesa, infensa às manifestações estrangeiras, direi mesmo, enclausurada pelo domínio português, que combatia as expressões regionalistas e separatistas, cujo caso emblemático é a Conjuração Mineira.
Para Soares Amora, o tipo de colonização lenta observada na América Portuguesa guardava relação com o interesse de Portugal pelas “atrações” do Oriente, observando-se no último quartel do século XVI, com o debaque do Império Oriental, uma perspectiva de compensação para o Brasil. A idéia foi frustrada por conta da crise vivida por Portugal em face da sede de conquista e domínio da Espanha, o que retardou o avanço do Brasil, porque a Portugal só interessava a sua independência política, reconquistada apenas em 1640.
Dalí em diante, Portugal cuidava de sua Restauração, dela cuidando durante a segunda metade do século XVII. Se antes Portugal não manifestava grande interesse pelo Brasil, sempre relegado ao segundo plano, somente no início do Século XVIII voltou a tomar pulso no reerguimento de suas colônias, em face da perda do poderio no Oriente e na atração despertada pela descoberta das nossas minas de ouro. Desta maneira, deduz Soares Amora, houve no Brasil duas épocas históricas na Era Luso-Brasileira.
A primeira abrange os séculos XVI e XVII, vale dizer, o Quinhentismo e o Seiscentismo português, limitados pela baliza 1549/1724. Esse período abriga as cartas informativas do Brasil, do Padre Manuel da Nóbrega, escritas da Bahia, documentos que o ilustre estudioso português reputa da primeira manifestação literária em nosso meio. Data de 1724 a fundação da Academia dos Esquecidos (Bahia). A segunda fase, referente ao século XVIII, ou ao Setecentismo Portugûes, pode ser delimitada em torno dos anos 1724 e 1808. Neste último ano, com a Transmigração da Corte Portuguesa para o Brasil, começa a se delinear o processo de autonomia política e cultural, em outras palavras, a Era Nacional da sua literatura, em função das reformas introduzidas pelo Príncipe Regente D. João, mais tarde, D. João VI, momento de relevante significado histórico de todos conhecido.
A Era Luso–Brasileira tem entre seus nomes de maior prestígio intelectual: o Pe. Antônio Vieira, Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Gregório de Mattos. Nascido em Salvador em 1633, Gregório de Mattos era uma figura singular. Repentista nato, tocador de viola, deixou sátiras que até hoje encantam. Versos que registram fatos da vida social e moral de Lisboa e da Bahia do seu tempo. Outro nome de destaque dessa época é Manuel Botelho de Oliveira, também nascido em Salvador, em 1936, cuja vida e caráter muito se distanciaram do seu contemporâneo, de quem foi colega no Colégio dos Jesuítas e na Universidade de Coimbra. Autor de Música de Parnaso, publicado em 1705, em Lisboa, poema em quatro línguas (português, castelhano, italiano e latim) e duas comédias imitadas do teatro popular espanhol, foi o primeiro poeta nascido no país a publicar suas poesias, de que muito se orgulhava. Também é autor do pouco lido poema: À Ilha de Maré.
Não se restringem apenas a esses nomes os representantes da literatura desse período, mas o espaço limitado não me permite fazer outras considerações.
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