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sexta-feira, 13 de julho de 2012

Os apartheids das cidades


Texto de Darcy Brito

Alguns arquitetos urbanistas culpam essa tendência de separar as pessoas por classe social em condomínios fechados, como uma das razões da violência ter crescido e se tornado corriqueira até mesmo em cidades de interior, antes quase imunes a este fenômeno.
Lembro-me bem que, quando criança, os bairros e as ruas das cidades eram de grande diversidade social. Podíamos encontrar do sapateiro ao doutor. A convivência era harmoniosa e até mesmo facilitadora, pois, se faltava algum ingrediente na cozinha na hora da preparação do almoço, corria-se rapidamente à quitanda da esquina para comprar o coentro. E todos se conheciam. Se o sapato apresentava algum problema, existia um sapateiro por perto. E, assim,  o sapateiro ganhava seu dinheirinho e o vizinho tinha seu problema resolvido. Não havia essa coisa de bairros, ruas e condomínios fechados.

As cidades foram criadas com o objetivo de integrar. Os espaços físicos são para ocupações e uso sociais. Barreiras significam delimitar quantidade e qualidade, e isto não é saudável, pois a monocultura é prejudicial até mesmo na agricultura, onde muitas vezes uma praga dizima toda a plantação de uma mesma espécie. A cidade deve ser projetada para as pessoas, com calçadas largas facilitando a locomoção e circulação dos seus cidadãos, inclusive os portadores de necessidades especiais. Hoje existem condomínios fechados até com escolas dentro, onde alunos de uma mesma “classe social” vivem fechados e desconfiados do garoto que vende balas e doces fora do seu portão. No meu tempo, o baleiro subia à varanda do meu sobrado para que minha mãe escolhesse o que queria comprar. A vizinhança era formada de médicos, alfaiates, engenheiros, advogados, encanadores, juízes, professores, pintores de paredes, padeiros, parteiras, rezadeiras, quitandeiros, cabeleireiro etc., e até mesmo uma ‘’banquinha do jogo do bicho’, para quem gostava de arriscar a sorte, sem nenhuma ligação com o atual tráfico de drogas, estes, comuns nas favelas ou “comunidades” das grandes cidades, rodeadas de condomínios de luxo. Quando todas as classes sociais se sentem integradas numa mesma comunidade, desfrutando das praças públicas, avenidas, bancos, igrejas, escolas e estabelecimentos comerciais, as diferenças ficam atenuadas e o ganho cultural é maior. Podemos notar uma separação de classes até mesmo nos shoppings, a depender do piso ou das alas. Pergunto: Como não acirrar a inveja dos que se sentem excluídos?
É claro que a situação não é de fácil resolução, dado ao estado em que chegou, com o crescimento desordenado das cidades e o descaso dos poderes públicos com os seus cidadãos.
Mas, como diz o pensador Berthold Brecht (1898-1956), Nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar. Portanto devemos incentivar os arquitetos urbanistas que ainda acreditam numa cidade mais humana, onde o cidadão é mais importante que os automóveis e os condomínios de luxo que confinam seus moradores.

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